Brasil, 2008, Drama de ação, 111 minutos

Direção: Bruno Barreto

Elenco: Michel Gomes, Marcello Melo Jr, Cris Vianna

CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA: 14 ANOS

Contém: Drogas, assassinato, relação Íntima

Áudio original em português

Sandro e Alessandro. Uma pequena diferença de nomes, um abrevia o outro. Mas, como personagens deste filme, se assemelham quando sentem a falta da figura materna. Vamos às histórias. A mãe de Alessandro, viciada, se vê impotente quando o tráfico, por dívida, toma seu bebê de si.  Passados os anos, evangélica fervorosa que agora é, esperança-se quando descobre que o garoto ainda está vivo e parte à sua procura. Já Sandro é uma criança que, um dia, corre apressadamente a um bar e esbarra num copo que se estilhaça no chão. Neste mesmo chão está sua mãe morta. Dali em diante, todo copo que estilhaça-se diante de si remontará o trauma. Ao não mais voltar para casa, é agora um dos menores de rua que perambulam pela região da Candelária, no Rio de Janeiro. Os novos amigos de Sandro julgam que, pela cara, ele parece se chamar Alê, e então este se torna seu apelido.

Num reformatório, Alessandro e Alê (Sandro) se encontram. Aquela mãe descobre o paradeiro, mas qual daqueles Alessandros é seu filho? O carcereiro leva a seu encontro o garoto errado, ainda assim seu instinto de mãe lhe garante que é ele. Questões éticas se põem à mesa. Sandro não age impensadamente. No fundo, talvez precise de uma mãe.

Frisando o diretor que a ficção é uma mera especulação da realidade, Última Parada se dá a licença de misturar personagens reais e fictícios e incrementar suas histórias narrando dois dos mais traumatizantes episódios da crônica policial carioca, e que serão mais detalhados em texto complementar: a Chacina da Candelária e o Sequestro do Ônibus 174. Outros copos estilhaçar-se-ão.

André Castilho

 

SANDRO, CANDELÁRIA E O SEQUESTRO DO ÔNIBUS 174

Igreja da Candelária, Rio de Janeiro, madrugada de 23 de julho de 1993. Um apedrejamento de viatura por menores de rua no dia anterior foi a desculpa que policiais desfardados arrumaram para “dar um susto” neles enquanto dormiam: abriram fogo contra quem por ali estivesse. Um dos baleados, sobrevivente, foi a testemunha primordial para identificá-los, o que lhe custou depois um novo atentado e exílio do país. Dos três policiais condenados, dois já foram postos em liberdade e um está foragido. Na época, havia um trabalho social feito por Yvone Bezerra: também testemunha-chave, também ameaçada tempos depois. Após o crime, conseguiu reunir boa parte deles em sua ONG.

No filme Última Parada: 174, Yvone é representada pela personagem Tia Walquíria, e o episódio é retratado quando Sandro vira um daqueles menores de rua. E por falar nele, é Sandro Barbosa do Nascimento outro dos sobreviventes. Tal como no filme, viu a mãe assassinada quando criança. Anos depois da chacina, voltaria com destaque ao noticiário urbano.

Jardim Botânico, mesmo Rio de Janeiro, tarde de 12 de junho do ano 2000. Sandro pegou o ônibus da linha 174 e, embora não tenha anunciado assalto, seu revólver estava à mostra. Interceptado pela polícia, o ônibus é sequestrado, os passageiros se tornam reféns e o trânsito é bloqueado. Sandro andava de um lado para o outro com a arma engatilhada e, abrindo as janelas, falava para quem quisesse ouvir: alimentava as ameaças constantemente; lembrava da Candelária e da Tia Yvone; fazia exigências e ironizava os policiais. Instalado o pânico, as TVs transmitiram ao vivo e a repercussão se internacionalizou. Após 5h de tensão, quando Sandro desce do ônibus, em fração de segundos um soldado se aproxima e lhe atira, e ele imediatamente baleia a refém que estava a seu tiracolo. O enterro de Geisa Gonçalves foi acompanhado por 3000 pessoas. Já o de Sandro, como indigente, foi acompanhado apenas por uma tia. Até hoje a ação da polícia é discutida, e a problemática social também.

André Castilho